Saturday, April 30, 2011

Rodrigo e Benjamin

Semana passada tive de ler Cantar de Mio Cid. Épica medieval espanhola. Enrolei muito até começar a ler o livro, edição com o espanhol antigo e o contemporâneo (com a versificação mantida). Quem não acharia que seria uma coisa bem chata para ler? Alguém pode me culpar por pensar isso?

Um dia engatei a leitura. Sabe como é? Sim, você sabe. A gente perde a hora, não sente que o horário de almoço já passou e se esquece que não é bonito tirar os sapatos e colocar os pés sobre a cadeira da frente, na biblioteca da faculdade. Rodrigo Díaz el de Vivar me ganhou. Fiquei imaginando um jogral recitando aqueles versos, diante de uma plateia, dia após dia (estudiosos imaginam que seriam três dias - um dia para cada canto). O jogral falava sobre algo que as pessoas tinham ouvido falar, que fazia parte da história do povo deles (Rodrigo, ou Ruy, existiu e seus feitos, não exatamente como os poetas expressaram, também). Pensei na audiência rindo com algumas ironias finas e da época colocadas no decorrer da história.

Então viajo agora na questão da literatura. Numa aula chatíssima e prolixa de Literatura Brasileira, aproveitei para dar uma espiada em um livro que acabara de adquirir, do Walter Benjamin. Pousei meu pensamento em um dos ensaios, "O narrador". Isso foi um dia depois de terminar o Cid Campeador. E fiquei meio emocionada quando entendi que o Benjamim estava falando diretamente para meu eu que terminou o Cantar do Mio Cid e refletiu sobre o falecimento daquele narrar vívido e próximo das pessoas. Tinha relacionado isso com o surgimento da imprensa, fazendo um paralelo da necessidade da pintura seguir novos rumos com o advento da fotografia. Mas por que não com a solidão do mundo do Romance?

E quando digo que livros têm alma, as pessoas me olham com aquela cara de: "tudo bem, deixa ela com essas ideiazinhas metafísicas". Mas quem pode dizer que o Benjamin não me procurou para dialogar? Fico feliz, afinal cada um tem o fantasma que merece.

Lembranças